O homem, na sua singularidade mais genuína e
profunda, destaca-se de toda a natureza pelas suas capacidades cognitivas,
afectivas, estéticas e religiosas. É pouco provável que qualquer outro animal
possua a faculdade de se ligar ao sobrenatural transcendente, por exemplo, pela
meditação, pelas atitudes de submissão, reverência e adoração, através da
oração.
A religião é uma manifestação eminentemente humana
e todas as culturas são profundamente marcadas por este fenómeno, porque: «Quando o homem crê em Deus e observa a
ínfima diferença que separa a natureza divina da sua, então se prostra diante
de Deus e o adora. A adoração é a máxima expressão da relação com Deus de um
ser humano (…). O significado da adoração é que Deus é absolutamente tudo para
quem o adora.» (KIERKEGAARD, 1944-412, in MONDIM, 1980:226).
Consideradas a sua finitude e precariedade físicas,
num mundo que ainda não conhece totalmente, o homem sente-se frágil e
dependente de algo que, dramaticamente, nem sempre ao longo da sua história
filogenética e ontogenética soube ou quis identificar.
Ao dar-se conta destas suas vulnerabilidades ele, o
homem-crente, procura abrir-se ao sobrenatural que designa por Deus, porque
sendo dotado de inteligência e de reflexão, rapidamente reconhece a existência
do sagrado e, livremente, é capaz de O amar ou odiar, todavia, para o homem de
fé, o que acredita numa existência transcendente, para além da vida biológica,
a busca de oportunidades para se encontrar com Deus, ente supremo e sagrado, é
incessante e persistente: «Neste
misterioso universo, existe uma coisa de que o Homem pode ter a certeza. O
Homem certamente não é a maior presença espiritual do Universo. (…) Existe uma
presença no Universo que é espiritualmente maior do que o Homem. O objectivo do
Homem é buscar comunhão com a presença por trás dos fenómenos, e buscá-la com o
anseio de harmonizar o seu próprio eu com essa realidade espiritual absoluta.»
(TOYNBEE, in SOCIEDADE TORRE DE VIGIA DE BIBLIAS E TRATOS, 1990: 366).
A dimensão religiosa do homem é, seguramente, um
aspecto essencial da sua superioridade face aos restantes animais que povoam o
mesmo mundo. O homem, centro e objecto das maiores investigações científicas,
apresenta-se, neste particular, como algo ainda misterioso, indecifrável,
incógnito.
Esta característica, única da sua religiosidade, o
distingue de todos os demais seres deste mundo que habita, justamente, porque: «O homem religioso se religa, relaciona sua
existência com um princípio supremo que rege e dá sentido a tudo o que existe.
Este princípio tem um carácter absoluto, incondicionado. É Deus. (…) Partindo
deste pressuposto, o homem religioso quer que sua vida cotidiana esteja em
consonância com esta ordem cósmica; (…) sua ética – os princípios que regem sua
conduta interpessoal e os objectivos válidos de sua vida, está subordinada aos
postulados e mandamentos de sua doutrina religiosa.» (ROMERO, 1998: 310-11).
Além desta inimitável característica que é a sua
capacidade religiosa, o homem continua um mistério porque conhecendo já, razoavelmente
bem, a sua constituição físico-biológica e podendo dela tratar com alguma
objectividade e sucesso, outro tanto não se verifica com a sua constituição
espiritual, desde logo porque ignora sua natureza, sua origem e seu destino,
mesmo quando se considera imortal, acreditando, em coerência com a existência
de uma outra vida transcendental, sem, contudo, conseguir provar,
cientificamente, tal imortalidade, o que lhe provoca uma sensação de impotência
e angústia: «O homem de hoje vive sem
certezas vitais sobre o que mais intimamente lhe interessa. (…) A sobrevivência
depois da morte é um problema pessoal que afecta o nosso próprio destino. Não é
como resolver uma questão que nos é indiferente.» (MARTINS, 1961: 162-63).
Bibliografia
MARTINS, Diamantino, S.J., (1961). Mistério do Homem; Ser, Personalidade,
Imortalidade, Braga: Livraria Cruz.
MONDIN, Battista, (1980). O Homem quem é ele? Elementos de Antropologia Filosófica, Trad. R.
Leal Ferreira e M. A. S. Ferrari; revisão de Danilo Morales, 3ª Ed., São Paulo:
Edições Paulinas. (Coleção Filosofia 1) ROMERO, Emílio, (1998). As Dimensões da Vida Humana: Existência
e Experiência, São José dos Campos:
Novos Horizontes Editora.
TOYNBEE, in SOCIEDADE TORRE DE VIGIA DE BÍBLIAS E
TRATADOS, (1990). O Homem em busca de
Deus, Edição Brasileira, São Paulo: Cesário Langue
O Presidente da Direção da
ARPCA,
Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo