Ainda que,
eventualmente, em algumas culturas e mentalidades, excessivamente focadas num
elevado desprendimento material, a verdade é que, atualmente, tal como no
passado, é impossível viver-se sem a componente monetária, independentemente da
sua proveniência, sendo certo que, na esmagadora maioria das pessoas, ela
resulta do trabalho, admitindo-se que toda a gente teria este bem essencial e,
noutras situações, o rendimento poderá ter a sua origem em reformas, pensões,
subsídios diversos, lucros, heranças, entre outras fontes possíveis, para
custear a sobrevivência de cada cidadão.
Indiscutivelmente
que a saúde é uma condição indispensável à vida e, à volta dela, se idealizam e
executam os mais fantásticos projetos que: uns, acabam por ter sucesso; outros,
ficam pelo caminho e, outros, ainda, conduzem ao fracasso. Também é verdade que
para o exercício de muitas atividades, importa mais a saúde mental do que a
física, noutras, todavia, é esta última que determina o desenvolvimento de uma
profissão. Em todo o caso, sempre é necessário estar-se na posse de uma boa
saúde, para se poder viver com algum conforto e esperança de vida.
E se a saúde é
condição fundamental, para se viver com alguma qualidade de vida, segue-se-lhe
o trabalho como um outro fator, que até pode ser complementar, mas que, sem o
qual: é muito difícil a realização individual das pessoas; a manutenção de uma
existência verdadeiramente humana; a proteção do indivíduo, da família e o
desenvolvimento sustentável da sociedade. Pelo trabalho a pessoa se engrandece
e se dignifica, independentemente da sua faixa etária, estatuto e convicções
diversas.
As pessoas
planificam e projetam para o futuro as suas vidas, quantas vezes, também, das
famílias e até, ainda que parcialmente, dos amigos. Ao longo da vida ativa,
exerce-se uma atividade profissional remunerada, cuja duração e condições foram
fixadas no início, através de um contrato de trabalho ou documento equivalente,
no qual se articulam deveres e direitos, que é subscrito pela entidade
empregadora e pelo trabalhador, sendo legítimo, justo e legal que as partes
exijam o cumprimento do clausulado que, livremente e de boa-fé assinaram.
A partir do momento
em que o trabalhador entra em atividade, nos termos do que ficou acordado com a
entidade empregadora, as partes ficam obrigadas a cumprir com as normas fixadas
no contrato e, desde logo, o empregado começa a receber o salário estabelecido,
com o qual vai administrar a sua vida e a da família e/ou dependentes. Trata-se
de um valor que será referência para os seus projetos de vida: quer enquanto
estiver no ativo; quer na situação de reforma ou pensão.
Para qualquer
pessoa que vive do rendimento do trabalho, que se comprometeu a cumprir com
todos os seus deveres, certamente, tem toda a legitimidade, que a legislação
que suportou a sua contratação, deve ser cumprida, rigorosamente, e que é
perfeitamente justo que reivindique, sempre, os seus direitos e, nesta
perspectiva, o seu projeto de vida deve ser concretizado, quer no ativo, quer
na reforma, considerando-se que toda e qualquer alteração das normas
contratualizadas, promulgadas à revelia do trabalhador, unilateralmente e em
seu prejuízo, é uma violação inaceitável dos seus mais elementares direitos,
designadamente, horários, redução de salários e pensões, aumento de descontos e
de enormes impostos. Não será justo, nem legítimo e, provavelmente, não será
legal que se modifique o que estava estabelecido entre as partes.
O trabalhador e,
mais tarde, o reformado/pensionista, “formatou” o seu projeto de vida em função
de um contrato que estabeleceu, de boa-fé, com uma entidade empregadora,
pública ou privada. Construiu a sua economia com base num salário, depois numa
reforma/pensão. Adotou um determinado nível de vida.
Assumiu compromissos,
por exemplo: um plano de seguro de vida e proteção na doença; aquisição da sua
própria habitação; um projeto de estudos e de formação, para ele e seus
familiares; um plano alimentar saudável; períodos de férias e de lazer, em
função dos rendimentos e, no último terço da sua vida, o descanso merecido,
confortável e digno.
Durante uma vida de
trabalho ativo, o empregado construiu o seu edifício económico para, na
velhice, ter o justo e merecido bem-estar, a todos os níveis, porque: «1. As pessoas idosas têm direito à
segurança económica e a condições de habitação e convívio familiar e
comunitário que respeitem a sua autonomia pessoal e evitem e superem o
isolamento ou a marginalização social; 2. A política de terceira idade engloba
medidas de carácter económico, social e cultural, tendentes a proporcionar às
pessoas idosas oportunidades de realização pessoal, através de uma participação
activa na vida da comunidade.» (CRP, 2004:40, Artº 72º).
Sem grande
dificuldade infere-se, portanto, que os rendimentos auferidos ao longo da vida,
enquanto trabalhador ativo e depois na situação de reforma/pensão, suportam uma
economia individual e/ou familiar que, em circunstância alguma pode ser
prejudicada, até porque tudo o que o trabalhador conseguiu e o que virá a
obter, por força das participações/contribuições que fez durante a sua vida
contributiva é seu: por direito próprio; por lei que então lhe foi aplicada e
que ele cumpriu, não podendo haver lugar a alterações que lhe sejam
desfavoráveis aliás, nunca se aplica uma lei retroativamente, quando ela é
menos favorável às pessoas.
A maioria das
pessoas vive dos seus salários, reformas e pensões. As suas economias
constroem-se e consolidam-se a partir daqueles rendimentos. Tudo funciona à
volta das receitas que se auferem com o exercício de uma atividade profissional
e é sabido que: «Em geral, sem
suficientes recursos económicos, a convivência com a família e os amigos fica
dificultada, o acesso a bens de cultura e educação fica condicionado, a
oportunidade para o divertimento, as viagens e as férias fica comprometida – o
trabalho perde significado.» (CUNHA, et. al, 2010:627).
O motor para o
desenvolvimento e progresso da sociedade poderá verificar-se se forem
respeitados os deveres e direitos das partes intervenientes –
empregadores/empregados que, em parceria leal, cumprem integralmente os acordos
que subscrevem.
A vertente
económica vai-se construindo e consolidando, quanto mais e melhor for a
produção e quanto maior for o poder de compra dos trabalhadores, porque é com
os seus salários, que devem ser justos e pagos atempadamente, que eles adquirem
os bens necessários a uma vida estável e condigna.
O empobrecimento
dos trabalhadores conduz, inevitavelmente, à falência das empresas, do próprio
Estado, da sociedade em geral e, eventualmente, vai enriquecer quem menos
precisa e que em nada contribui para a sustentabilidade de uma pessoa, família,
grupo e comunidade, com nível e qualidade de vida, e a dignidade que é devida e
exigida para com toda a pessoa humana. A mão-de-obra barata, o desemprego, as
enormes cargas fiscais, obviamente, conduzem à miséria, à fome e ao suicídio.
Cada vez mais se
impõe uma política de salários e reformas/pensões ao nível das exigências da
vida moderna, no quadro de uma sociedade exigente, esclarecida e que tem
direito a melhores condições de existência digna. A competitividade das
instituições, públicas e privadas, não se faz com baixos salários, muito menos
com redução dos mesmos: «Com efeito os
baixos salários são uma fraca fonte de vantagem competitiva. É mais prudente
seguir outras estratégias de vantagem competitiva, como qualidade mais elevada,
conhecimentos únicos, inovação de serviço, produto ou processo.»
(Ibid.:635).
Identicamente se
pode pensar em relação aos reformados/pensionistas que, ao lhes serem reduzidos
os seus rendimentos, a respetiva economia familiar sofre perdas que afetam o
poder de compra deste estrato da população, que é cada vez mais significativo,
quer em qualidade, quer em quantidade.
Verifica-se,
atualmente, que é este grupo etário que até já vem suportando parte dos
encargos familiares, que não auferem rendimentos suficientes para a sua
subsistência. É esta parcela da população que está a substituir o Estado,
funcionando como se fosse uma Instituição de Solidariedade Social e Caridade
para a família desprotegida, amigos e vizinhos.
Por outro lado,
cada vez mais se recorre aos reformados/pensionistas para, de alguma forma,
colmatar a miséria em que milhares de famílias estão a sobreviver, e se ainda
continuam a sofrer reduções nos rendimentos, para os quais descontaram uma vida
inteira, com a agravante de lhes serem aplicados impostos brutais, então o
futuro destas sociedades está condenado à mais completa indigência, ao
extermínio dos mais fracos, fragilizados e vulneráveis.
Acresce, também, o
imperativo do cumprimento dos deveres e direitos, que no início de uma carreira
profissional, foram estabelecidos entre as partes, não sendo legítimo, nem
justo e, falta saber se, constitucionalmente legal, seja possível alterar as
regras a meio da vida e/ou quase no fim da existência das pessoas, precisamente
quando elas mais precisam dos seus rendimentos. Exige-se, por isso, o respeito
pela dignidade das pessoas em geral e dos mais velhos em particular.
A remuneração, reforma
ou pensão são, portanto, instrumentos que possibilitam um nível de vida
relativamente adequado às necessidades da pessoa humana, que fortalece a
dignidade que lhe é devida, inclusive à luz da Declaração Universal dos
Direitos Humanos, que proporciona maior auto-estima, consoante o valor que a
pessoa recebe.
Concordando-se, ou
não, pode-se aceitar que: «Embora a
maioria das pessoas não trabalhe apenas pelo dinheiro, não é possível viver sem
ele. Para além da satisfação das necessidades materiais o dinheiro é um
instrumento de satisfação de necessidades sociais, uma fonte de prestígio e de
status, e um sinal de reconhecimento que a organização presta à pessoa. O
salário (reforma e pensão) ([i])
é também uma forma de a organização
retribuir à sociedade e à comunidade o que esta lhe presta. É devido a essa
lógica de cidadania que, por vezes, se argumenta que uma organização tem a
responsabilidade social de pagar aos seus membros o salário mais alto que lhe
for comportável.» (Ibid.:682).
Bibliografia
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA, (2004),
Versão de 2004. Porto: Porto Editora.
CUNHA,
Miguel Pina, et al., (2010). Manual de Gestão de Pessoas e do Capital Humano.
2ª Edição. Lisboa: Edições Sílabo, Ldª.
O Presidente da Direção da ARPCA,
Diamantino Lourenço Rodrigues de
Bártolo
Sem comentários:
Enviar um comentário