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domingo, 4 de outubro de 2015

Idade da Vida


Refletir sobre a “Idade da Vida”, pode parecer um exercício simples, a partir da ideia, segundo a qual, ela estará inserta em vários documentos pessoais e não só: nasceu no dia tal, de um determinado ano e, fazendo as contas até ao presente, obtém-se uma idade, dita cronológica e que hoje em dia corresponderá à verdade, todavia, haverá uma diferença substancial entre quem vive intensamente e diversificadamente e quem se deixa comandar por um certo comodismo rotineiro, monótono e, praticamente, inalterável, dia-após-dia.

Habitual e oficialmente, a idade que é aceite consta de um documento de identificação que, por vezes, nomeadamente para efeitos de empregabilidade, e não só, prejudica quem tem uma idade cronológica certificada mais avançada, independentemente das condições físicas, psicológicas e intelectuais, sabendo-se que, designadamente, por exemplo, em Portugal, quem tem quarenta ou mais anos de idade já é considerado velho para trabalhar e muito novo para se reformar, resultando daqui, uma inqualificável discriminação negativa, para as pessoas naquelas circunstâncias.

A sociedade também está estratificada por idades. A pirâmide etária da população contempla: crianças, jovens, adultos e idosos, sendo que um país poderá ser tanto mais promissor e sustentável, quanto a sua elevada taxa de natalidade e, portanto, uma pirâmide com uma base alargada, assegura uma demografia em crescimento, em vários contextos de abordagem: equilíbrio entre quem “chega ao mundo” e quem está prestes a “partir”; tentativa de adaptação entre gerações; melhores condições de vida para os mais velhos, se os mais novos tiverem por eles um mínimo de respeito e consideração, de resto, como se costuma dizer: “o mundo é das crianças e dos jovens”, aliás: «A vida é tanto mais longa quanto maior for o coeficiente de bem-estar material e espiritual que possamos dar à existência do velho» (FARIA, 1973:20).

Por outro lado, a idade biológica também é um outro elemento muito importante na vida de cada pessoa, e determinante quanto ao envelhecimento, porque existe uma diferença entre as duas idades: cronológica e biológica, a saber: «A idade cronológica está relacionada simplesmente ao tempo de vida que uma pessoa possui. Já a biológica está relacionada ao envelhecimento das células que, por sua vez, está diretamente ligado aos hábitos e qualidade de vida. E essa idade biológica poderá ser corrompida por fatores evitáveis que interferem na idade cronológica e causam o desequilíbrio» (in http://rspress.com.br/health4life/idade-cronologica-x-idade-biologica/ em 05.08.2015).

Preconceituosamente, pauta-se a existência humana entre dois extremos: os jovens e os idosos, intermediando entre eles o que vulgarmente se designa por adultos, aqueles que estão ou pretendem ingressar no mundo do trabalho, desenvolver uma atividade profissional, e depois atingirem uma idade que lhes permita viver sem trabalhar, através da atribuição de uma reforma, pelos anos de descontos para um sistema de segurança social.

Com alguma frequência, observa-se haver um certo desfasamento entre os mais velhos e os mais novos, talvez porque determinados princípios, valores e sentimentos não foram incutidos logo à nascença e pela vida fora. Com efeito: «O que em verdade se verifica é a incompreensão, a intolerância, para não dizer mesmo a falta de solidariedade, dos mais moços, em relação aos mais velhos, esquecendo-se que a juventude passa depressa e que amanhã entrarão também no outono da vida, aptos portanto a receberem o mesmo menosprezo e o mesmo apodo da geração que os antecedem.» (Ibid.:76).

Na perspectiva da possibilidade de colaboração efetiva à sociedade, a vida, realmente, não terá idade, não se compreendendo as razões porque a partir de certas idades são dificultadas a prestação de determinadas tarefas, e a continuação do exercício de funções desempenhadas ao longo de uma carreira profissional. Mentalidades que defendem estas e outras posições, contra o aproveitamento de conhecimentos, experiências e sabedoria dos idosos, de facto em nada contribuem para uma sociedade mais justa e desenvolvida.

É sabido que: «O velho quando está em condições de colaborar com o governo não sabe como viver. Fecham-lhe todas as portas, impossibilitando-o assim de prestar serviços e de ser útil à comunidade, quando ainda se sente apto para o trabalho. Cria-se desse modo o preconceito de que só os moços têm direito à vida ativa e que os velhos devem ser marginalizados. Os que não podem portanto tirar partido de suas próprias iniciativas, não encontram os meios de subsistência necessários nos diversos setores de atividade humana.» (Ibid.:85).

A indiferença com que a sociedade em geral, e os governantes e empregadores em particular, têm manifestado pelas pessoas mais idosas revela-se, precisamente, desde logo, no acesso aos meios de subsistência: seja para ampliar eventuais rendimentos; seja para adquirir o mínimo indispensável para viver com dignidade.

Reunidas determinadas condições, realmente a vida não pode ter idade, e se se pretende uma sociedade mais justa, mais competitiva, economicamente mais saudável, não se compreende como é possível a um país, dar-se ao luxo de dispensar mão-de-obra qualificada, experiente, responsável e sábia. Esta situação leva-nos a pensar que poderá haver uma gestão inadequada dos recursos humanos, até porque: “Ser idoso não significa ser doente ou inválido; assim como ser jovem não é forçosamente sinônimo de saúde”.

E se em algumas profissões, nomeadamente a nível da medicina, os médicos reformados podem continuar a trabalhar, sem corte nas pensões e auferindo mais um determinado complemento, então os mesmos critérios deveriam ser aplicados a outras profissões e atividades, porque de contrário estamos perante uma discriminação negativa, em que uns são portugueses de primeira; outros de segunda ou terceira categorias e, a ser assim, é inqualificável tal situação.

A vida não tem idade. A vida tem melhores ou piores condições para que ela proporcione as possibilidades, ou não, respetivamente, para que as pessoas possam continuar a trabalhar, a serem úteis à sociedade, ao bem-comum e não é afastando da vida ativa tais pessoas que a situação económica, a qualidade de vida e a sustentabilidade das instituições se conseguem.

Naturalmente que não se está a defender, nesta reflexão, que as pessoas se mantenham a trabalhar toda a vida, mas sim: a) enquanto tiverem saúde; b) assim o desejem; c) depois de atingirem um tempo mínimo para passarem à reforma, não necessariamente pelo método cumulativo, mas apenas quando atingir uma das condições: ou idade, ou tempo de serviço, ou tempo de descontos.

A partir daqui o sistema político governamental, empresários e empregadores, devem continuar a ter ao seu serviço pessoas que, apresentando-se em boas condições físicas, psicológicas e intelectuais, como já foi referido, queiram continuar a dar o seu melhor, porque uma política com estas características só traz benefícios para todas as partes: trabalhadores, Estado, Empregadores e a Sociedade.

A Vida não tem idade: «Ninguém envelhece enquanto não perde o interesse pela vida, enquanto o espírito não se sente envelhecido, enquanto o coração não se torna frio e indiferente. A arte de envelhecer é viver sem se sentir velho. É nos sentirmos ativos e seguros diante da vida» (Marden, in FARIA, 1973:108).

E se é possível medir o tempo cronologicamente, ao ponto de se poder definir qual a idade de uma pessoa ou de um acontecimento, a partir de um momento de referência, por exemplo: no que respeita à era d.C. (depois de Cristo) e, no nosso caso, afirmar-se que estamos no ano de 2015, outro tanto não se pode aceitar em relação à idade biológica que depende do estado de envelhecimento dos órgãos e células do corpo humano. Por outro lado o tempo dos sentimentos, das emoções, do sofrimento e do prazer é diferente de umas situações para outras.

Quando vivemos em sofrimento, o tempo parece que não “corre”, dizemos que é uma “eternidade”; mas se se viver uma situação inversa, de prazer e alegria, então o tempo “passa” rapidamente, e nem sequer damos por essa velocidade. De igual forma, quando desejamos muito alguma coisa boa, o tempo como que para, o que não acontece quando pressentimos que algo de mal está para acontecer, por isso também dizemos que o tempo é “psicológico”.

Evidentemente que não é possível ignorarmos certas situações de falta de saúde, em função das idades cronológica e também biológica. Com efeito, algumas doenças, muito típicas, surgem com mais frequência nas idades relativamente avançadas, enquanto que na maioria dos jovens e adultos, o que ocorre com mais assiduidade são os acidentes, podendo-se afirmar que: «Quando um velho está satisfeito com a vida, quando encontra prazer em viver, quando sente alegria em seu ambiente, a idade não existe. Muitos velhos felizes se surpreendem quando ouvem pela primeira vez alguém os chamar “de velho”. Até então nunca haviam pensado nisso.» (FARIA, 1973:162).

Seguramente que a realidade está patente ao nosso conhecimento, e se numa perspectiva espiritual, principalmente para os crentes, a vida não tem idade, a verdade é que todos sabemos que a vida física tem um princípio e um fim, é mais longa para umas pessoas, mais curta para outras ,e também se sabe que: «Uma vida longa não repousa apenas nos alicerces físicos do corpo, mas também na defesa da nossa mente, do nosso espírito. Não se pode alimentar o corpo quando o espírito trabalha mal.» (Ibid.:184).

Aceitando, portanto, a dualidade da vida: física e espiritual, é possível assumir uma posição consensual, segundo a qual, existe um limite para vida física e, provavelmente, uma eternidade, não quantificável, para a vida espiritual. Além disso, a partir do estado de espírito das pessoas, das suas atividades, também se pode afirmar que a vida não tem idade, embora, cronologicamente, a idade possa constar de documentos oficiais e, biologicamente, a degradação dos órgãos e células apontem para mais idade.

 

Bibliografia.

 

FARIA, Carlos Coelho de, (1973). A Vida não tem idade. Uma experiência a serviço da Gerontologia Social. 2ª Ed. São Paulo: Departamento de Geriatria D. Pedro II da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paula e Editora Bisordi. Ltdª.

 

O Presidente da Direção,

Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo

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