Aceitam-se todos os contributos que tenham por objetivo
enriquecer um processo de educação e formação para os direitos humanos e
cidadania, cuja finalidade suprema é erradicar a iniquidade e as distorções sócio-económicas
que atualmente se verificam na humanidade.
Uma das vias, possível de contribuir para a luta
contra tantas incongruências, algumas aberrações e toda uma panóplia de males,
passa pela educação sócio-cultural, a iniciar-se em todas as escolas e também
por um processo de formação ao longo da vida, incluindo o conceito de “aprender a aprender”.
Partir para um nova ordem mundial, baseada num novo
paradigma, que urge desenvolver e consolidar: a Escola Cultural ou, mais
abrangentemente, a Escola Pluri-intercultural, a influenciar cada pessoa, o
mais cedo possível na vida de cada uma, porque a responsabilidade da escola
inter-pluricultural é imensa.
Na verdade: «O
paradigma da Escola Cultural é muito favorável à educação para os direitos
humanos, quer pelas actividades educativas que promove e aconselha, quer pela
sua estrutura pedagógica, quer pela filosofia personalista em que assenta. Com
efeito, a Escola Cultural caracteriza-se: a) pela centração da educação na
pessoa, que quer ver completamente respeitada na sua eminente dignidade; b)
pela concepção cultural da educação, definindo a cultura como a obra do
espírito criador e livre do Homem, acrescentada à pura Natureza; c) pela
concepção pluridimensional e cultural da Escola; d) pelo funcionamento concreto
da Escola, flexível e democrático, aberto à livre e responsável expansão de
todos os aspectos estruturais da personalidade dos educandos.» (PATRÍCIO,
1999:98).
Quanto mais não seja, e como base de trabalho,
pode-se concordar que a via para a paz, não no sentido de ausência de guerra,
mas a paz como situação universal que proporciona à humanidade bem-estar geral,
harmonia e felicidade, percorre o itinerário compreendido entre o respeito
pelos direitos humanos e o exercício pleno da cidadania democrática, esta na
perspectiva da participação ativa e profícua de cada um e de todos os cidadãos,
na vida das respetivas comunidades.
A paz, também entendida como erradicação de todo e
qualquer tipo de violência: física, psicológica, económica, religiosa, política,
ética, cultural e sócio-profissional, entre muitas outras mais subtis, como a
chantagem, os assédios, o medo e a superstição.
Impõe-se uma nova cultura que possibilite a
implementação de paradigmas que fomentem as boas-práticas, desde o mais cedo
possível e ao longo da vida de cada pessoa, que constituam como que um alimento
essencial para a vida boa, digna, pacífica, produtiva e verdadeiramente
humanista, porque: «O caminho para a paz
passa por resoluções criativas do conflito, o que, geralmente, significa a
transformação de algumas estruturas, e, através da substituição de culturas de
violência por culturas de paz, deslegitima a violência. O uso da violência para
punir o agressor não resolve os conflitos nem deslegitima a violência. Pelo
contrário, provavelmente congela o conflito e legitima a violência. Por outras
palavras, não só não é produtor da implementação dos direitos humanos, mas é
mesmo contraproducente…» (GALTUNG, 1994:213).
O apelo à paz, à preservação da vida humana e ao
estabelecimento de plataformas de diálogo, para a resolução dos conflitos,
sucedem-se um pouco por todo o mundo, e a partir das mais altas instâncias dos
poderes nacionais e organizações internacionais, invocando-se, reiteradamente,
o respeito pelos Direitos Humanos e pela Cidadania.
Ignorar a riqueza e diversidade dos valores que
sustentam toda uma cultura, na circunstância, a cultura dos deveres, direitos e
valores humanos, aliada às múltiplas dimensões da pessoa humana, constitui uma
atitude que não beneficia o diálogo nem a paz, nem a felicidade da humanidade,
porque, em boa verdade, existem valores básicos que facilitam,
substancialmente, a construção de uma sociedade efetivamente humana, e que para
o ser plenamente, deverá considerar a pessoa como uma unidade indivisível na
sua dignidade, mas também cultivar, até por boas-práticas, o seu lado mais
inefável, profundo e único – a sua dimensão sobrenatural –, que pela via
religiosa pode e deve cuidar.
O ser humano não se extingue com a morte física, na
medida em que: «A pessoa humana alcança
assim – pela via sobrenatural da Fé e da graça – um coroamento divino de sua
vida espiritual. O horizonte e o âmbito das dimensões da pessoa se engrandecem,
desse modo, até a infinitude do divino. Sem confundir-se com Deus e sempre essencialmente
finita e contingente, a pessoa humana entra assim a participar da mesma vida de
Deus: pela aceitação da revelação e a vida da graça nesta vida eterna, pela
visão de Deus e a glória da vida imortal.» (DERISI, 1977:54).
O homem que utiliza bem, aqui no sentido da sua
própria felicidade, este valor supremo que é a Fé, que se manifesta no seu
espírito, estará mais seguro no que respeita ao seu destino último, a sua vida
terá sempre um sentido. Os seus ideais e objetivos, certamente, adquirem uma natureza
mais sobrenatural, sem descurar a sua posição no mundo material, para o qual
tem de estar atento e protegido porque: «Um
dos maiores perigos para a nossa vida e a fonte mais justificável de medo é a
guerra. Contra esse perigo também o Estado deve tomar precauções…», não
devendo ignorar que: «Na vida de qualquer
grupo de homens existem divergências inevitavelmente legítimas, tanto quanto
tentativas de burla e aqueles podem exigir como último recurso uma solução
imparcial.» (MABBOTT, 1968:120-21).
É na união desta existência dicotómica – corpo e
espírito – no homem que se pode rentabilizar, para o bem-comum, a ação humana, nomeadamente,
através das respetivas organizações sócio-politicas, com destaque para o
Estado, aqui assumido no governo legítimo e democrático.
A educação sócio-cultural, que se considera
essencial e uma via segura na busca da paz e obtenção da felicidade da pessoa
humana, é possível implementá-la, a partir da sociedade organizada e dos seus
agentes socializadores, dos quais se enfatiza, nesta reflexão, além da Escola,
a Igreja, através da religião que alimenta a Fé. Invoca-se a Fé, afinal, em
muitas circunstâncias da vida.
Uma educação sócio-cultural integra nos seus
curricula esta dimensão exclusiva do homem e, sem preconceitos nem discriminações,
cabe às instituições responsáveis pelos sistemas de ensino e formação apoiar,
no sentido do reconhecimento e legalização curricular, as religiões
predominantes e secularmente interiorizadas e praticadas pelos respetivos
crentes.
Na circunstância, o exemplo que a Fé Cristã vem
dando ao mundo, pela assunção de compromissos sociais, poderá constituir-se
como um excelente incentivo às demais e grandes religiões que, por quaisquer
razões, ainda não conseguiram dar o seu pleno contributo para a paz.
Nesse sentido, o papel da Igreja, hoje, é
insubstituível na construção da concórdia, na busca da felicidade e essencial
para dar um destino à vida porque: «Nunca
foi tão grande a chance da Igreja de participar, de trazer uma colaboração
decisiva, e isto por uma razão bem precisa. Nunca se viu com tanta clareza que
a solução desses problemas não depende apenas nem principalmente de factores
técnicos, mas depende decisivamente de factores éticos e morais. (…) A Igreja
anuncia a solidariedade na promoção como o único caminho para a própria
sobrevivência da espécie.» (BIGO & ÁVILA, 1983:280).
Elevar os Direitos Humanos e Cidadania ao estatuto
de disciplina académica, obrigatória em todas as Escolas de Ensino, Educação e
Formação, em todos os cursos, com peso idêntico a outros conhecimentos, tidos
por nucleares, é um imperativo que se reclama como um desígnio universal.
Envolver o domínio Sócio-Cultural, em todas as suas vertentes, com inclusão das
próprias Religiões, será uma estratégia a considerar que, seguramente,
conduzirá à Paz enquanto preservação da Vida e Dignidade Humanas.
Uma política universal, sob a forma de uma Nova
Ordem Internacional, para a vida e felicidade da espécie humana, não será uma
utopia, dentro de algumas gerações, se os atuais responsáveis, em cada país, em
cada comunidade, em cada família e em cada indivíduo humano, promoverem e
incentivarem uma nova cultura dos valores, dos deveres, dos direitos mais
sublimes e específicos da humanidade.
O mundo, com todas as suas riquezas, existe antes
do homem, portanto, ninguém deveria arrogar-se o direito de que um determinado
recurso lhe pertence, em exclusivo. A distribuição da riqueza deverá ser
universal e os que agora se proclamam donos de bens naturais e se consideram
ricos, deveriam iniciar o processo de partilha das riquezas que o Criador
colocou no mundo, igualmente para todos, sem discriminação, desde logo a
começar pelos próprios concidadãos, porque a geração que hoje está no poder,
amanhã será substituída por outra e assim sucessivamente.
Todos os descendentes devem ter as mesmas
possibilidades de viverem em paz, em abundância e conforto, numa sociedade mais
humana e feliz, porque o que hoje, para muitos, poderá ser utopia,
possivelmente, num futuro não muito longínquo, tornar-se-á uma realidade,
porque é insustentável haver uns poucos, com tanto; e muitos outros, com tão
pouco, então, antes que aconteça uma tragédia bem mais catastrófica do que a da
Segunda Guerra Mundial, homens e mulheres de todo o mundo, entendam-se,
conciliem-se e devolvam à humanidade o que Deus-Criador doou a todos por igual:
paz, abundância, recursos, harmonia e felicidade.
Bibliografia
BIGO, Pierre, S.J., &
ÁVILA, Fernando Bastos, S.J., (1983). Fé
Cristã e Compromisso Social; Elementos para uma reflexão sobre a América Latina
à luz da Doutrina Social da Igreja, 2. Edição revista e aumentada, São
Paulo: Edições Paulinas.
DERISI, Octávio
Nicolás, (1977). Valores Básicos para a
Construção de uma Sociedade Realmente Humana, Trad. Alfredo Augusto Rabello Leite, São Paulo: Mundo Cultural.
GALTUNG, Johan, (1994). Direitos
Humanos – Uma Nova Perspectiva. Tradução
Margarida Fernandes. Lisboa, Instituto Piaget
MABBOTT, J.D., (1968). O Estado e
o Cidadão, uma introdução à Filosofia Política, Trad. Jorge Natal da Costa,
Rio de Janeiro: Zahar Editores.
PATRÍCIO, Manuel Ferreira, (1999). “Escola Cultural e Educação para os
Direitos Humanos”, in Educação para os
Direitos Humanos. Actas do Congresso. Ponte de Lima: Amnistia
Internacional. 11 a 13 de Março de 1999, 97-101
O Presidente da ARPCA, em Exercício,
Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
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